segunda-feira, 8 de julho de 2013

Afinal, há homofobia na igreja?


Por Alexandre Feitosa

Desde que o projeto de Lei 122/2006 ganhou fama, principalmente pela polêmica gerada, o termo homofobia e seus derivados, embora já existissem, tornaram-se populares, também, no discurso dos cristãos em geral. As acusações são recíprocas entre a militância LGBT e os líderes cristãos. A Militância acusa a Igreja de ser homófoba e a Igreja acusa a militância de reivindicar um tratamento privilegiado aos gays em detrimento da maioria da população. Analisar o propósito do PCL 122 não é o objetivo deste artigo, pois já fizemos isso em textos anteriores. Nosso objetivo é analisar se há ou não homofobia nas igrejas convencionais. Afinal, o que é homofobia? Seria apenas uma forma patológica de ódio irracional e extremo aos homossexuais a ponto de causar agressão e morte ou pode, também, corresponder a uma postura – ainda que de omissão – por parte da sociedade ou mesmo da Igreja?

Se entendermos a homofobia como medo irracional quanto à homossexualidade, não é tão descabida a afirmação de que a Igreja, em geral, é homófoba. Por quê? Primeiro pela falta de espaço que o assunto possui ali. Há medo, temor e receio em se abordar aberta e francamente o assunto, sem o viés da condenação teológica. A posição da Igreja quanto à homossexualidade revela-se unilateral, ou seja, as interpretações literais bíblicas direcionam o discurso, centrado, sempre, na condenação. Essa “clareza” bíblica sobre a homossexualidade (lembremo-nos sempre de que a Bíblia apresenta atos homossexuais, não o conceito de homossexualidade). Há uma recusa em se conhecer a fundo o assunto, acreditando-se que a Bíblia já oferece o suficiente para entendê-lo e julgá-lo. Enquanto isso, no seio da Igreja, cristãos homossexuais – em segredo – anseiam por respostas e, principalmente, por uma atenção especial ou, ao menos, um pequeno espaço, que revele, de fato, o amor que a igreja tanto prega. Essa espera é angustiante e, com frequência, acaba por afastar os cristãos gays do rebanho. Ao ignorar o assunto, recusando-se a conhecê-lo ou oferecendo apenas uma visão condenatória, a postura da igreja acaba por ser, ainda que em menor grau, homofóbica, já que se baseia na ignorância e no medo em abordar o tema. A falta de conhecimento sobre o assunto gera a irracionalidade, a irracionalidade gera o temor em falar abertamente sobre a homossexualidade. Não é à toa que grande parte dos cristãos homossexuais prefere deixar a Igreja a tornar pública sua condição, bem como o seu dilema e as suas lutas, quase sempre solitárias. Se a Igreja não lhes parece um lugar acolhedor, um lugar de amigos sinceros e interessados em sua dor, a melhor postura é sair dali ou viver clandestinamente no grupo.

Engana-se quem pensa que a homofobia ocorre apenas em forma de atos discriminatórios. O silêncio é uma forma de violência. A Igreja, ao silenciar-se ou limitar sua abordagem da homossexualidade, acaba por tornar-se um espaço de violência, conhecida como simbólica. Um exemplo de violência simbólica é a existência de uma norma quando nem todos possuem a capacidade de segui-la: os grupos religiosos, quando muito, oferecem apenas o celibato ao cristão homossexual, privando-lhe de um direito essencial: o exercício da afetividade – direito também bíblico. Mesmo simbólica, essa realidade configura-se como violência, pois causa danos à alma do indivíduo. Outra forma de violência é conduzir, ainda que inconscientemente, o cristão homossexual a seguir a norma, ou seja, o relacionamento heterossexual, em que os danos podem ser ainda maiores, pois envolverá outras pessoas.

Talvez, a Igreja acredite não haver homossexuais em seu meio, consequentemente, não vê razões para aprofundar a discussão ali, afinal, aquele não é um problema de seu rebanho. Isso é um mito. Qualquer estrutura religiosa, como parte da sociedade, possuirá membros de orientação homossexual. O fato a ser admitido, na verdade, é que ela não está preparada para responder sobre o assunto. Como responder questões, como oferecer conforto, como conduzir uma situação sobre a qual se desconhece? Impossível. A maioria heterossexual dita as normas (heteronormatividade), a minoria, se quiser e puder, que se adéque a tais normas, do contrário não encontrará espaço.

A igreja afirma amar os homossexuais e não discriminá-los, mas os únicos que possuem propriedade para afirmar isso não é a igreja, mas os próprios homossexuais. A Teologia Inclusiva, tendo como base os princípios bíblicos, não ignora, entretanto, que uma teologia não se constrói apenas unilateralmente, com base nas normas sociais. Seu diferencial é construir bases a partir das experiências, das histórias e da vida das pessoas de orientação homossexual.

Outra forma de homofobia praticada nas igrejas é a violência verbal. Com certa frequência se ouvem dos púlpitos piadas, palavras que refletem estereótipos sobre gays, lésbicas e transexuais e outras colocações ofensivas. Certo pregador televisivo, muito conhecido pela postura agressiva, diz amar até bandidos, quanto mais os homossexuais – o que coloca os gays em categoria semelhante à dos criminosos. Certa deputada católica afirma não querer perder o direito de demitir uma babá lésbica ou um motorista gay, pois corre o risco de que seus filhos sejam molestados, sugerindo que homossexuais são pedófilos. 

Por fim, abordaremos a pior consequência da homofobia religiosa: o suicídio que muitos gays e lésbicas cometem por acreditar que não há lugar para eles na igreja, muito menos no reino de Deus. 

Uma frase do reverendo Caio Fábio reflete bem isso: “o único exército que mata seus soldados feridos é a Igreja.”

Vivemos em um país cristão, cujos conceitos morais foram moldados segundo a interpretação bíblica da normalidade das relações afetivas: homem e mulher. Ser heterossexual, nessa sociedade, equivale a ser normal, ao passo que ser homossexual equivale a ser anormal. A impossibilidade de muitos homossexuais em seguir a norma provoca o que chamamos de homofobia internalizada, ou seja, um sentimento de repulsa pela própria sexualidade. Tal sentimento, reforçado pelo discurso religioso e reafirmado pela sociedade acaba por provocar uma situação irreversível quando o jovem opta por tirar a própria vida.

Em tempos passados (e presentes) homossexuais eram (são) vistos como ameaça à sociedade, ameaça às famílias, aos jovens e às crianças. A tendência natural do ser humano, logicamente, é afastar de si qualquer tipo de ameaça. O episódio de Sodoma – e sua leitura equivocada – levou muitos aos tribunais da inquisição, pois a simples presença de homossexuais em determinada localidade poderia, a exemplo de Sodoma, provocar a ira divina. Essa visão foi propagada pela Igreja durante a Idade Média e prevaleceu por certo tempo, inclusive na época do Brasil Colonial. 

Conclusão: embora os cristãos não admitam, existe homofobia na igreja. As consequências estão aí como provas: elas vão desde a evasão de ovelhas homossexuais ao suicídio. Que um dia a igreja possa rever os seus dogmas e concluir que os ensinamentos bíblicos provocam vida e não morte. Foi para isso que Jesus veio. João 10.10.

A fim de exemplificar o que foi exposto, segue um vídeo, parte do documentário For the Bible tells me so. Vale a pena conferir.


3 comentários:

  1. Belo texto, pastor (como sempre).
    Apenas um comentário (que em nada interfere no entendimento do texto): Acredito que o nome do documentário seja For The Bible Tells Me So.
    Graça e paz.

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    Respostas
    1. Alice, obrigado pela correção! De fato o nome é este!

      Deus te abençoe!

      Volte sempre!

      Abraços fraternos,

      Pr. Alexandre Feitosa

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  2. Olá, Pr. Alexandre.
    Parabéns e obrigado pelo post.
    Eu penso que vale lembrar também que entre os cristãos GLBT que anseiam por "um pequeno espaço, que revele, de fato, o amor que a igreja tanto prega," existem aqueles que acabam acreditando que a maneira com que são tratados, corresnponde a amor. Digo isto porque fui um deles. Se em meus sentimentos, eu me ferisse com algum insulto vindo do banco ao lado ou do púlpito, logo elaborava que aquele insulto não era dirigido a mim, mas à homossexualidade em mim. Eu ainda achava que minha sexulidade e eu, poderíamos e deveríamos andar separados. Isto me faziar "engolir os sapos" de uma maneira permissiva, submissa e alienada. Minha auto-estima, simplesmente, não existia. Acredito que esta coisa de desprezar a si mesmo - aninda que inconscientemente - fere o Epítido Santo dentro de uma pessoa - sem contar com os danos psicológicos que podem levar o suicídio. Felizmente sobrevivi a isto. Hoje, sei que Jesus me ama do jeitinho que ele mesmo me fez: cheio de cores!

    Que Deus continue te usando e iluminando. Obrigado!

    Jon

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