Pastor Alexandre Feitosa
Conclusão
O
presente artigo não pretende defender a banalização do sexo, pelo contrário, pretende
ser uma reflexão contra a opressão religiosa imposta aos casais que não
formalizaram em cartório sua união. Geralmente, as igrejas cristãs rotulam a
vida conjugal antes do casamento civil como fornicação/prostituição, praticando
clara acepção de pessoas, privando casais de desenvolver lideranças ministeriais ou de participar em
determinados ritos eclesiásticos, como o batismo e a ceia. Mas seria bíblica
essa doutrina?
Analisaremos
os principais textos utilizados para defender uma vida conjugal apenas após a
formalização do casamento civil.
Para
solucionarmos essa questão, é necessário fazermos uma pergunta: havia casamento
civil na Bíblia? A resposta é NÃO. Nem no Antigo e nem no Novo Testamento[1]. Logo,
a Bíblia não exige que duas pessoas se unam civilmente para serem reconhecidas
como casadas. Tal exigência das igrejas cristãs é recente[2],
já que o casamento civil foi institucionalizado na primeira metade do século
XIX. Poderia a Bíblia poderia condicionar a vida conjugal a um contrato jurídico criado séculos depois de ter sido escrita? Obviamente que não! É como dizer que
a Bíblia condena a ligadura de trompas e a vasectomia com base em Gênesis 1.28.
Na sociedade bíblica, o que havia era um acordo entre o pai da noiva e o interessado em desposá-la. Esse contrato – de natureza verbal – exigia o pagamento de um dote – normalmente alto – ao pai da moça. É importante ressaltar que as filhas eram consideradas propriedades do seu pai. O noivo praticamente comprava uma esposa. Consentimento por parte da moça era algo que não existia![3] Hoje, o acordo não é mais entre famílias, mas entre as duas pessoas que desejam constituir um lar. Não havia casamento religioso entre os judeus, mas uma festa que durava 7 dias. Detalhe: o sexo acontecia antes da festa, quando os noivos, já devidamente instalados na câmara nupcial, consumavam a união. A partir de então, dava-se início aos festejos. O casamento consistia em uma vida em comum, na mesma casa, e o ato sexual determinava a unidade do casal, ou seja, o casamento em si (Compare Gênesis 2.24 com 1 Coríntios 6.16). Não há nas Escrituras nenhuma menção a algum documento equivalente a uma certidão de casamento. O único documento relativo ao casamento somente era redigido em caso de divórcio, e consistia em uma carta de repúdio com a qual o homem se separava formalmente de sua mulher (Deuteronômio 24.1).
Na sociedade bíblica, o que havia era um acordo entre o pai da noiva e o interessado em desposá-la. Esse contrato – de natureza verbal – exigia o pagamento de um dote – normalmente alto – ao pai da moça. É importante ressaltar que as filhas eram consideradas propriedades do seu pai. O noivo praticamente comprava uma esposa. Consentimento por parte da moça era algo que não existia![3] Hoje, o acordo não é mais entre famílias, mas entre as duas pessoas que desejam constituir um lar. Não havia casamento religioso entre os judeus, mas uma festa que durava 7 dias. Detalhe: o sexo acontecia antes da festa, quando os noivos, já devidamente instalados na câmara nupcial, consumavam a união. A partir de então, dava-se início aos festejos. O casamento consistia em uma vida em comum, na mesma casa, e o ato sexual determinava a unidade do casal, ou seja, o casamento em si (Compare Gênesis 2.24 com 1 Coríntios 6.16). Não há nas Escrituras nenhuma menção a algum documento equivalente a uma certidão de casamento. O único documento relativo ao casamento somente era redigido em caso de divórcio, e consistia em uma carta de repúdio com a qual o homem se separava formalmente de sua mulher (Deuteronômio 24.1).
Ou
seja, utilizar as Escrituras para acusar de fornicação um casal que não
formalizou em um cartório o seu casamento é uma incoerência e demonstra total
desconhecimento de como se dava o casamento na Bíblia. A palavra casamento significa vida em comum em uma
mesma casa. E é esse o sentido que a Bíblia apresenta. Se não, vamos confirmar:
10 Quando saíres à peleja
contra os teus inimigos, e o Senhor teu Deus os entregar nas tuas mãos, e tu
deles levares prisioneiros, 11 E tu
entre os presos vires uma mulher formosa à vista, e a cobiçares, e a tomares
por mulher, 12 Então a trarás para a tua casa (vida em comum
sob o mesmo teto); e ela rapará a cabeça e cortará as suas unhas. 13 E despirá o vestido do seu
cativeiro, e se assentará na tua casa, e chorará a seu pai e a sua mãe um mês
inteiro; e depois chegarás a ela (relação
sexual), e tu serás seu marido e ela tua
mulher (ou seja, serão marido e mulher apenas após a intimidade, não antes).
14 E será que, se te não contentares dela, a deixarás ir à sua vontade; mas de
modo algum a venderás por dinheiro, nem a tratarás como escrava, pois a tens humilhado. Deuteronômio 21.10-14
Percebe-se,
no texto acima, que o casamento começa a partir do momento em que a mulher é
levada à casa do homem e o ato sexual acontece. Ou seja, os casamentos
realizados na época bíblica não seriam reconhecidos nos dias de hoje pela
Igreja!
Alguns
utilizam 1 Coríntios 7.9 como prova bíblica de que o sexo só deve ocorrer
depois do casamento civil. Uma vida conjugal antes da formalização jurídica da
união é considerada fornicação[4]/prostituição.
Vamos ao texto:
Digo, porém, aos solteiros e às viúvas: é
bom que permaneçam como eu. Mas, se não conseguem controlar-se, devem casar-se,
pois é melhor casar-se do que ficar ardendo de desejo. 1 Coríntios 7:8,9 (NVI)
Paulo
não está falando a pessoas comprometidas[5],
mas a solteiros e viúvas. O contexto imediato (capítulos 5 a 7) indica que tais
pessoas viviam sob o risco de prostituição, pecado que caracterizava a cidade
de Corinto (6.16-20). Nesta perícope, Paulo apresenta suas recomendações como concessão,
não como mandamentos do Senhor, (v.6-9). Quanto aos casados, sim, os
imperativos são divinos (v.10). Essa informação basta para que esse texto não
seja utilizado como um imperativo bíblico ao casamento civil.
O
casamento é apresentado por Paulo como caminho a ser trilhado por pessoas que
apresentavam dificuldade em conter-se sexualmente. Ele diz que o casamento é
melhor que uma vida de desejos irrefreados que, naturalmente, conduziriam à
tentação pelo sexo ilícito: especialmente a prostituição – v.5. Para Paulo, é
melhor que os cristãos aliviem suas tensões sexuais dentro do casamento[6], uma
vez que estavam cercados pela imoralidade sexual do mundo gentílico (Confira 1
Tessalonicenses 4.3-7).
O caso da mulher samaritana
Disse-lhe Jesus: Vai, chama o teu marido,
e vem cá. A mulher respondeu, e disse: Não tenho marido. Disse-lhe Jesus:
Disseste bem: Não tenho marido; Porque tiveste cinco maridos, e o que agora
tens não é teu marido; isto disseste com verdade. João 4:16-18 (ACF)
A
mulher samaritana tivera cinco maridos e agora relacionava-se informalmente com
outro homem. O texto nada prova sobre vida conjugal antes do casamento pois o
narrador não expõe as circunstâncias daquele relacionamento. É bastante
razoável que seu pecado fosse o sexo fora do casamento e não o sexo antes do
casamento. É provável que aquele homem fosse um amante e que não morasse com
ela. A resposta da mulher a Jesus (Não tenho marido) reforça essa
interpretação.
Hebreus 13.4
Venerado seja entre todos o matrimônio e o leito sem
mácula; porém, aos que se dão à prostituição, e aos adúlteros, Deus os julgará.
Hebreus 13:4 (ACF)
O
texto é um elogio à sacralidade do matrimônio que se mantém puro e um alerta
contra o adultério e a prostituição. O autor inspirado não vincula matrimônio ao
que chamamos de casamento civil. Até porque o matrimônio aqui apresentado era
aquele constituído de acordo com a cultura judaica.
Conclusão
Como
pastor e estudioso das Escrituras, não sou contra quem defende o uma vida
conjugal apenas após o casamento civil. Sou contra o tratamento discriminatório
reservado aos casais que optaram por uma vida em comum sem a obrigatoriedade do
casamento civil. Sou contra a hostilidade dedicada às Igrejas que não exigem o
casamento civil aos seus membros, antes, respeitam a vontade do casal em
formalizar ou não juridicamente seu relacionamento.
É
salutar recomendar o casamento civil, especialmente para que os envolvidos possam
usufruir dos direitos por ele proporcionado. A Bíblia respeita e encoraja o
casamento, porém não diz que Deus o considera válido apenas quando oficializado
em um cartório. Assim, casais que vivenciam a intimidade conjugal sem os protocolos do
casamento civil não estão em promiscuidade, prostituição ou outro tipo de pecado sexual. As igrejas que discriminam
esses casais, interferem em sua decisão pessoal, muitas vezes forçando-os a uma
atitude não planejada, tomada apenas para serem aceitos, não por convicção
mútua.
[1] O casamento civil foi instituído na
Europa a partir de 1836, sendo sancionado no Brasil em 1890 pelo Marechal
Deodoro da Fonseca.
[2] Antes do casamento civil, era o
casamento religioso que oficializava as uniões.
[3] O casamento mediante consentimento dos
noivos só começou a ser formalizado em 1140 com o Decreto de Graciano, obra escrita pela Igreja e
que tratava de questões relativas ao direito canônico.
[4] É importante ressaltar que a palavra
fornicação não consta nas Escrituras. É uma tradução do grego porneia (relações sexuais ilícitas como
a prostituição e o adultério). Fornicação vem de fornice – palavra latina e não grega – que designava os arcos
romanos onde as mulheres se expunham para a prostituição. Da prática de
prostituição, a palavra chegou a significar o sexo entre pessoas solteiras,
descompromissadas. Logo, fornicação é promiscuidade. Atribuir o pecado de
fornicação a casais comprometidos constitui-se uma acusação injusta e sem a
mínima base bíblica.
[5] Os conceitos de namoro e noivado não
existiam na época do Apóstolo. A jovem era prometida em casamento (desposada),
mediante pagamento de dote e esperava cerca de um ano até que o noivo a
buscasse para consumar o casamento. A lua de mel durava normalmente 7 dias,
apenas após esse período os cônjuges apareciam aos convidados para receber os
presentes.
[6] Por exemplo, se alguém diz, que carne
branca é melhor que carne vermelha, não necessariamente estará dizendo que não
se deve comer carne vermelha, apenas dizendo que a carne branca é melhor. O
mesmo raciocínio se aplica ao versículo em questão.